A segunda edição do relatório “Panorama da Violência Letal e Sexual contra Crianças e Adolescentes no Brasil 2021-2023”, realizada pelo UNICEF e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), revela um cenário aterrador para a infância e adolescência no país. Publicado em agosto de 2024, o estudo traz à tona dados preocupantes sobre a extensão e a gravidade da violência que atinge jovens brasileiros.
Entre 2021 e 2023, foram registradas 15.101 mortes violentas intencionais (MVI) de crianças e adolescentes e impressionantes 164.199 casos de estupro e estupro de vulnerável, envolvendo vítimas entre 0 e 19 anos. Esses números evidenciam o grau de risco enfrentado por essa população, com 91,6% das vítimas letais concentradas na faixa etária de 15 a 19 anos, 90% das quais eram meninos, e 82,9% negros.
A análise por faixa etária demonstra um agravamento contínuo da situação. Em 2021, ocorreram 4.803 MVI; em 2022, o número subiu para 5.354, e, em 2023, houve uma leve queda, registrando-se 4.944 casos. A maior parte dessas mortes foi causada por homicídios dolosos, feminicídios, latrocínios, lesões seguidas de morte e mortes decorrentes de intervenção policial, segundo o relatório.
O estudo também destaca a persistente vulnerabilidade da juventude negra no Brasil. A taxa de mortalidade entre adolescentes negros do sexo masculino é 4,4 vezes maior que entre seus pares brancos. Entre 2021 e 2023, pelo menos 9.328 crianças e adolescentes negros foram assassinados.
No que diz respeito à violência sexual, o relatório revela que os números não param de crescer. Em 2021, foram registrados 46.863 estupros de crianças e adolescentes; em 2022, o número subiu para 53.906, e, em 2023, atingiu 63.430 casos, representando um aumento de 13,8% em relação ao ano anterior.
A violência sexual atinge majoritariamente meninas, com 87,3% dos casos registrados, sendo a faixa etária de 10 a 14 anos a mais vitimizada, representando 48,3% das vítimas. Entre as crianças de até 9 anos, 35,8% dos casos de estupro foram registrados, evidenciando a brutalidade dos crimes cometidos contra os mais jovens, que muitas vezes não possuem a capacidade de compreender o que está acontecendo.
Além disso, o relatório sublinha a prevalência do ambiente doméstico como local dos crimes, com até 72% dos estupros ocorrendo dentro de casa. O fato de os autores desses crimes serem, na maioria das vezes, conhecidos das vítimas, agrava ainda mais o cenário. Em 2023, o Brasil registrou uma taxa de 116,4 estupros por 100 mil habitantes de até 19 anos, com variações significativas entre os estados. Mato Grosso do Sul, por exemplo, apresentou as maiores taxas do país nos três anos analisados.
A violência sexual contra meninos, embora menos frequente que contra meninas, também não pode ser ignorada. Nos últimos três anos, 20.575 meninos foram vítimas de estupro, superando o número de mortes violentas intencionais registradas na mesma faixa etária.
Diante desses dados, o relatório apresenta uma série de recomendações, como a necessidade de enfrentar o racismo estrutural, controlar o uso da força pelas polícias e restringir o acesso a armamento bélico por civis. A proteção das crianças e adolescentes brasileiros requer, segundo o documento, um esforço coordenado e urgente para combater a banalização e a normalização da violência em todas as suas formas.
Confira o relatório: https://www.unicef.org/brazil/media/30071/file/panorama-violencia-letal-sexual-contra-criancas-adolescentes-no-brasil-v04%20(003).pdf.pdf